Pearl Jam: Apoteose para uma ode ao Rock simples e direto
Resenha - Pearl Jam (Maracanã, Rio de Janeiro, 22/11/15)
Por Marcello Cohen
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Num belo dia de 2005, este que vos escreve assistia ao Pearl Jam
do alto de seus 13 anos. Se para esse garoto aquele foi um dos
primeiros grandes passos dentro do Rock, para os fãs da banda era o fim
de uma espera de 15 anos, já que era a estreia da banda no país. Ali foi
eternizado um casamento entre Brasil e Pearl Jam,
e 10 anos depois a banda liderada por Eddie Vedder chega pela 4a vez
por aqui. Para mim, esse seria o 3o, e carimbado pelas experiências
inesquecíveis de 2005 e 2011, já tinha uma noção que a noite de Rock
N'Roll no Maracanã seria inesquecível.O Pearl Jam divulga ainda o ótimo Lightning Bolt, lançado em 2013. A banda em estúdio já é ótima, mas aqui se trata definitivamente de uma banda de palco. Eddie Vedder, Jeff Ament (baixo), Stone Gossard e Mike McCready (guitarra) e Matt Cameron - tirando o último, que entrou em 1998, formação intacta desde antes da estreia - dão a vida em cada apresentação. Para quem não conhece bem como as coisas funcionam, são mais de 30 músicas escolhidas na hora em algo próximo de 3h de show. Sonho para qualquer fã não é mesmo? Quem vai ver o Pearl Jam ao vivo, pode ouvir qualquer coisa que a banda fez, de hinos absolutos ao mais obscuro lado b.
A maioria dos cerca de 50 mil fãs que lotaram o Maracanã tinha perfeita noção disso ai, e a participação de cada um foi simplesmente louvável. Isso inclui também os covers, mostrando que os mesmos também apreciam um bom Lennon, Neil Young e Floyd - não mais que a obrigação, mas nem sempre isso acontece. O estádio melhorou muito para shows desde o show do Foo Fighters no começo do ano. A entrada não era tão burocrática, com objetos inofensivos sendo barrados, a oferta de bebidas era melhor ao longo da pista, entre outros detalhes. Tirando os distantes banheiros, estava tudo impecável para um grande show de Rock. O principal num show, que é o som, estava simplesmente maravilhoso para uma apresentação ao ar livre. Que comece a brincadeira.
Sem abertura e com cerca de 1h de atraso, o show começa com uma porrada no coração logo de cara. OCEANS, nada mais que isso. Essa lindeza presente na obra-prima Ten faz a sua estreia na tour, emocionando até uma pedra e dando um começo que só a banda poderia prever. Nada mais Pearl Jam que isso. A banda sempre se notabilizou pela crueza, no som e produção em geral. O barulho típico de garagem, aquele rockão simples e sem enfeites que é a base do som - entre baladas e pancadas - está intacto. Além da música em si, a banda nunca foi de fazer grandes cenários e produções no palco. A base de tudo é a alma entregue ali, misturando grandes músicas com muita entrega.
Depois do baque de Oceans, o show segue com Present Tense, um lado c do também lado c No Code. Uma bela canção que raramente é lembrada em meio a tantas outras. Nessa tour, a banda faz uma curiosa opção por músicas mais lentas nas aberturas, e é assim por aqui também. O público gosta, e canta junto desde o inicio. A clássica Corduroy arrebata o Maracanã de vez, num começo sensacional. Jogo ganho, só dar sequência. Hail, Hail é outra de No Code a aparecer, essa uma das mais lembradas dele. É hora de novidades, talvez com a melhor de Lightning Boult, a pedrada Mind Your Manners. Para ficar melhor, nada mais correto do que um hino, que atende pelo nome de Do the Evolution. A música agita por natureza, fazendo todos saírem do chão enquanto entoam cada verso, com destaque para o refrão. Em shows longos assim, isso ainda é o aquecimento, tanto para o público quanto para a banda. O esquema é esse mesmo, e tudo ficaria ainda mais quente. Amongst the Waves representa o bom e relativamente recente Backspacer (2009), música que já é um marco na história da banda. Save You também pode ser chamada de clássico, justo para representar o fantástico Riot Act (2002), que merecia até mais algumas representantes. Já Even Flow dispensa apresentações, e nem é preciso reforçar como o Maracanã virou uma bomba nesse momento. A bela Who You Are é mais uma pérola escondida que a banda saca.
Em meio a tudo isso, vemos um Eddie Vedder em estado de graça. A banda é redondinha, mas é inegável que esse senhor é a alma do Pearl Jam. Sua voz maravilhosa comanda toda a brincadeira, e em meio a tudo que ele representa, isso acaba sendo apenas um detalhe. O cara é a energia e carisma em pessoa. Agita o tempo todo, bebe vinho, brinca com o público com discursos hilários e sérios em português, aproveitando como ninguém naquele estádio cada minuto do show. Não a toa, as grandes bandas em ação são aquelas que amam o que fazem, não apenas pela grana, mas acima de tudo pelo prazer que o Rock proporciona.
Assim sendo, nem chega a soar estranho ouvirmos Setting Forth, música de sua carreira solo. Se falarem que é uma da banda, todos acreditam. A apresentação vai caminhando para a metade com a boa Not for You, uma das muitas lembradas de Vitalogy. Infelizmente, a melhor delas - Immortality - ficou para a próxima. Sirens já é um grande hit, mais um na coleção, mostrando que o disco mais recente é bom mesmo. Given to Fly está facilmente no meu top 5 da banda. Maravilhosa como só ela, agita bastante e tem cada verso urrado pelos presentes. Junte a isso a grande sacada do telão, com imagens da cidade culminando no estádio, com imagens aéreas do público ao seu redor no dia do show. Além de receber a apresentação, não tem como negar que o Maracanã também se enquadra nos cartões postais cariocas, mesmo desconfigurado e reduzido. Todos que podem lotar esse estádio com seu talento artístico ou esportivo levam isso como um marco em sua carreira. I Want You So Hard (Boy's Bad News) é uma linda homenagem ao Eagles of Death Metal, banda lamentavelmente marcada pela tragédia da estupidez humana em Paris. A pedrada Comatose é uma das principais do disco de 2006 que leva o nome da banda, já totalmente familiar aos seus seguidores. A rapidinha Lukin chega junta da ótima Rearviewmirror, encerramento do tempo regulamentar do show.
Para o Pearl Jam, é apenas o começo, ainda tinha muito para ver e ouvir. Eddie retorna portando um violão, para apresentar a bela nova Yellow Moon. Ainda nesse esquema, vem a clássica e maravilhosa Elderly Woman Behind the Counter in a Small Town. Just Breathe é sem dúvidas a mais amada dos últimos lançamentos, bela como só ela, foi dedicada aos casais presentes. O momento é realmente muito bonito, e explode com Imagine, a celebração universal da paz, num show de luzes de arrepiar. Depois da calmaria, é hora de plugar os amplificadores. O hino Jeremy já arrepia no clássico riff de baixo de Jeff Ament, mata alguns do coração e vê seus versos e solos cantados em uníssono. Para manter a pegada, a maravilhosa Why Go mostra a força descomunal de Ten, e sua importância incontestável na história do Rock. Para mim, a dobradinha foi o ponto máximo do show. A boa The Fixer e a porrada perfeita Porch, mais uma de Ten, encerram mais um bis de maneira matadora.
Nunca é demais ressaltar a felicidade de garoto do líder da banda, com uma bermuda e camisa que lembram aquele Vedder dos anos 90. Quem olha percebe claramente que o tempo não passou para ele, ainda em magnífica forma física e vocal. Hora do split final, que começa simplesmente com Last Kiss, uma letra bem triste, e igualmente emocionante. Ai vem uma dose fantástica de Pink Floyd, com a indescritível Comfortably Numb. Spin the Black Circle volta a programação normal, abrindo caminho para o hino Black, uma balada daquelas para emocionar qualquer um. Better Man em seguida simplesmente arrebata os corações de todos, que como uma boa torcida de futebol, entoam hino após hino do Pearl Jam, banda que mostra na prática seu valor na história do estilo. Ai chega o hino máximo Alive, que me fez bater cabeça como um garoto de 12 anos, época que comecei a ouvir a banda. Foi de arrepiar. Para o fim, o clássico de Neil Young Rockin' in the Free World transforma o estádio numa celebração sem fim de um púbico/banda em estado de graça. Para fechar a tampa, o tradicional fim com a pérola Yellow Ledbetter, já com as luzes acesas desde a música anterior. Nela acontece o momento mais hilário da noite. Uma sunga surge no palco, e Vedder não perde tempo. Fazendo graça, veste ela e brinca enquanto toca mais um de seus hinos.
Que fim de festa, apoteose para uma ode ao Rock simples e direto que a banda se propõe a fazer, e faz como poucos. Um estádio lotado vai na pilha de um senhor com espírito de garoto, feliz em proporcionar ao seu público uma noite inesquecível. Mesmo quem não é fã se impressiona com shows assim, e a todos, fica a certeza que o Pearl Jam vai voltar para um show imprevisível e arrebatador num futuro bem próximo.
Vale a pena viver - nem que seja para dizer que não vale a pena...
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