segunda-feira, 8 de junho de 2009
;0 Texto do David de Coimbra no ZH ...
A tática infalível de Mariana
Foto: Fraga
Fraga
Mariana nunca havia se sentido tão nua. Mas estava vestida, o corpo bem coberto: calças jeans justas como se tivesse nascido dentro delas, botas de cano alto até os joelhos e uma blusa tão leve quanto a consciência do Wianey Carlet. Ainda assim, sentia-se nua. Os olhares dos homens do lugar arrancavam suas roupas às fatias. Mariana recém chegara ao clube no qual seu marido trabalhava como treinador. Havia estacado à margem do campo de treino, e os olhares dos jogadores a lambiam como se ela estivesse coberta de leite condensado.
Julião, chamava-se o marido técnico. Um durão. Havia sido zagueiro tosco no passado, e o estilo de jogar se lhe infiltrara na alma. Julião era um ser humano tosco que se dizia sincero. Orgulhava-se da sua franqueza, de falar sem subterfúgios, de olhar no olho do interlocutor, aquela coisa. Julião era áspero com todos, era sempre rude. Menos com Mariana. Na frente de Mariana, ele virava suflê. Ela era 30 anos mais jovem, era loira, magra, alta, linda e sorridente. Tratava-o por “Ju”, e só ela podia tratá-lo dessa forma.
Pois um dia Mariana pediu para vê-lo trabalhar. Julião não recusou – não lhe negava nada. Levou-a ao campo.
E foi aí que ela se sentiu nua.
No começo, ficou incomodada. Mas, com o correr do treinamento, os olhares dos jogadores foram cevando-lhe o orgulho de mulher bonita. Era bom ser desejada, era bom saber que os homens cobiçavam seu corpo. Sentiu-se uma pantera, uma cavala, uma cachorra, tudo ao mesmo tempo.
Depois daquela tarde, suas visitas ao clube se tornaram frequentes. Gostava de experimentar a sensação de ser alvo da concupiscência masculina. E cada dia Mariana ia com uma roupa mais ousada. Deixava que antevissem uma faixa de carne dourada de seus ombros redondos, ou um pedaço das suas longas pernas, ou o delicado piercing que lhe feria o umbigo. Eles ensandeciam de desejo. Eles a queriam, como a queriam.
Um dia, de todos, foi o mais especial. Mariana se encostara à porta fechada do vestiário. De repente, ouviu o diálogo entre dois jogadores que estavam parados do outro lado. Um disse:
– O que eu mais queria era ver aquela mulher nua.
Mariana estremeceu. Supunha que falavam dela. Mas seria mesmo? Sentiu palpitações. Apurou o ouvido. O outro jogador como que arfou, e o que disse entre dentes quase a fez desfalecer de contentamento:
– Cara, tudo o que eu quero na vida é ver essa mulher do treinador nuinha! Nuinha em pelo!
E o outro:
– Dou todo o meu salário só para ver aquela mulher sem roupa!
Mariana como que flutuou pelo pátio do estádio. O maior desejo daqueles homens era vê-la nua! O corpo dela suscitava todos aqueles desejos, todas aquelas ânsias. Era maravilhoso. Era um sonho.
Depois disso, Mariana passou a ir ao clube todos os dias. O problema é que o time começou a perder. O grupo de jogadores apresentava dissensões, o vestiário estava desunido. O emprego de Julião entrou em risco. Foi o que ele disse uma noite para Mariana.
– Acho que vou perder o emprego – suspirou, enquanto vestia o pijama de sapinhos que ela lhe dera.
Mariana ficou apreensiva. Não queria que ele trocasse de clube. Não queria perder o contato com os olhares quentes dos jogadores. Mas o time não vencia mais. As brigas no vestiário se sucediam. Ninguém se entendia no clube, e Julião não conseguia mais impor sua autoridade. Até que chegou o dia decisivo.
– Se perdermos domingo, estou na rua – comunicou Julião à sua jovem esposa durante o café da manhã de sexta-feira.
Mariana dormiu mal aquela noite. O sábado ela passou casmurra, em sofrimento silencioso. Na manhã de domingo, resolveu tomar uma atitude. Foi até o hotel onde todos estavam concentrados. Chamou Julião. Ele desceu até o saguão. Antes de lhe dar um beijo de saudação, pegou em seus cotovelos e perguntou:
– Você confia em mim?
Julião estranhou, mas sabia que a mulher falava a sério.
– C-confio – gaguejou.
– Então me deixa falar a sós com os jogadores. Reúna todos em uma sala e depois saia. Preciso de 10 minutos com eles, e nós vamos ganhar o jogo.
Julião quis saber o que ela faria, o que ela diria, mas ela respondeu que não podia contar.
– Dez minutos – repetia, sem cessar. – Preciso apenas de dez minutos para explicar a minha tática.
Julião topou. Não lhe negava nada. Poucos minutos depois, Mariana entrou na sala em que os jogadores foram reunidos. Estavam sentados em cadeiras de ferro. Ela usava um vestidinho de alças e sapatos de salto alto. Parou de pé diante deles. Falou:
– Vou dar agora o que vocês sempre quiseram de mim.
E, com a mão direita, baixou a alça esquerda do vestido, expondo um seio firme de tamanho standard. Com a esquerda, removeu a outra alça, e ambos os seios se mostraram aos jogadores. Formavam um lindo par. Aí ela empurrou o vestido para além da cintura fina, das ilhargas sinuosas, das coxas fortes, dos joelhos redondos, das canelas lisas. O vestido pousou nos escarpins. Os jogadores estavam sem fôlego. Mariana continuou ali parada, só de calcinha, escarpins e piercing. Levou as mãos às tiras das calcinhas. O meia-esquerda começou a gemer baixinho.
– Se nós vencermos hoje – miou ela. – Tiro o resto antes do próximo jogo.
E entrou no vestido outra vez. E foi-se embora.
As preleções de Mariana tornaram-se célebres no clube. O time ganhou o campeonato. E Julião jamais descobriu qual era, afinal, a tática revolucionária concebida por sua mulher.
* Texto publicado na página 43 de ZH de domingo.
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